25 de julho de 2011


O criador conhece bem a criação e procura construí-la com o que há de melhor. Com o tempo a criação apresenta defeitos, lá vem o criador concerta e/ou aperfeiçoa, de repente a criação apresenta vontade própria e o que faz o criador? A deixa livre. Livre, ela não sabe cuidar de si mesma, não compreende seu próprio funcionamento, então volta e pede ao criador:"_ Faça a tua vontade!"

21 de julho de 2011


Na área de lazer de um prédio haviam duas crianças.
Uma mãe arruma o filho, coloca aquela sandalinha esportiva e carrega sua bicicleta.
O filho se cansa e então ela pega o chinelo do Ben10, mais confortável.
A mãe queria porque queria comprar uma bicicleta para o filho, mesmo que ele não quisesse. Ela sempre quis ter uma bicicleta quando criança, então daria ao filho. Normal. Pais desejam dar o melhor aos filhos.
O outro menino que estava na área de lazer, estava descalço, sujo, com roupas rasgadas e observava a bicicleta. Aproximou-se e perguntou: _ essa bicicleta é dele?
e a mãe do menino disse: _sim. Algo doeu em seu coração.
O menino andou, andou, andou em sua bicicleta até cansar-se e outro observou até cansar-se.
A mãe disse: _filho, deixa aquele garoto andar na sua bicicleta? e ele respondeu: _não, mamãe quero entrar, estoou cansado. Mesmo assim a mãe chamou.
O menino descalço, sujo, com roupas rasgadas mesmo com a insistência não andou de bicicleta e ficou observando, observando sozinho sem nenhuma criança.

Quando era criança tive uma bicicleta, mesmo aprendendo andar somente com doze anos. Gostava de ter uma bicicleta. Hoje o que eu gostaria é que todas as crianças tivessem uma bicicleta. Amanhã o menino cansado também vai desejar isso.

20 de julho de 2011


Há dias e dias.
Tem dias que preciso despedir-me de mim mesma.
Dias de crescer. Preciso crescer. Escolher.
Escolha por mim, assim não erro.
Tem dias que sei quase tudo e acerto de primeira, mas
se me metamorfosear for despersonalizar-se, eu aceito a condição.

19 de julho de 2011

Reencontro dos sonhos


Meu velhinho em Bodocó.
Comendo queijinho com doce de leite. Bodocó não fica em Minas.
Ele viajou e meu sonho começou a se realizar.
Meu velhinho me chamou e disse: "Vem vê as fotos!" Feliz.
Já voltou de viagem.
Lá, reencontrou parentes, chorou, relembrou naquele sítio a infância. Descansou da vida agitada de São Paulo e agora tem seus documentos de velhinho acertos em sua cidade. Creio que vai conseguir aposentar-se.
Me dói todos os dias pela manhã vê-lo sair com a velhinha para trabalhar. Eu chego e eles ainda não chegaram, muitas vezes chegam e dizem que não fizeram quase nada de dinheiro. Meu velhinho tem mais cabelos brancos que o normal para sua idade, são as preocupações.
E eu tenho mais sonhos que o normal para a minha idade.
Meu velhinho está tão feliz!
Ele é tão correto. Agora com a aposentadoria, vai fechar o bar, vai abrir uma loja e principalmente: vai com toda a família à igreja.
Meu sonho vai se realizar.
Quero ver meu velhinho feliz assim todos os dias, tendo a certeza que vai conseguir pagar as contas no fim do mês, tendo a certeza de que o tempo não o apaga da memória daqueles que ficaram em Bodocó.
Parece até que ele tem mais vida agora.
Meu velhinho é o melhor avô, pai, amigo que alguém pode ter.
Sempre achei baboseira essa coisa de que o pai é o herói do filho. Mas é verdade.
Meu avô é meu herói, porque ele tem tanto coisa na mente e mesmo assim se importa em saber como eu estou, se feliz ou triste, se as coisas estão dando certo na faculdade e até mesmo na igreja. Ele é correto, sensato, amoroso... ele é incrível.
Seu reencontro me proporcionou o início da realização do meu sonho.

ps.: pessoas perguntam: pra que você quer passar no vestibular? "_Quero conseguir com bom emprego, fazer mestrado e doutorado e comprar uma casa para meus avós, pais e tios, apesar de saber que Deus pode fazer tudo isso."
pessoas perguntam: qual os eu maior sonho? "_Dizer eu e minha casa servimos a Deus."

11 de julho de 2011

Diferença igualitária



Note a diferença entre a cor da pele e o branco dos dentes?
Mas não é exatamente disso que vou falar.
Há muito quero escrever, enfim...

Em um ônibus havia uma jovem rodeada por adolescentes desconhecidos. estranhos, na verdade. estranhos para ela, como jovem, mas absolutamente normais entre eles.
Ela estava bem no meio deles, ônibus lotado. São Paulo, às 12h, e o trajeto passa por pelo menos quatro escolas. Natural ter muitos adolescentes ali. De qualquer maneira ela não levantaria para ficar em pé e deixar os adolescentes livres para falar mais besteiras.
Dos que estavam ao seu redor, quatro eram brancos e um negro. Até aí não há nada de importante nisso. Seguindo.
Era perceptível que o garoto negro era mais novinho que os outros. mais pobre que os outros, pelas roupas e material escolar e principalmente: mais inocente.
O que a irritava não era a presença dos adolescentes, porque ela gosta muito de adolescente, mas seus comportamentos.
Tudo o que ela ouvia a levava à reflexão. Os brancos faziam o garoto negro de bobo, xingavam mãe, pai, eram estúpidos e estragavam o pouco material que o garoto negro tinha. Mesmo assim, ele permanecia com eles.
Eles falavam que o menino era fedido, era burro, pretinho, não pegava ninguém e mesmo assim o menino permanecia ali.
Ela pensava: "Que bom que você é diferente!" e ao mesmo tempo pensava: "Por que você quer ser como eles?"
O menino negro era diferente, mas queria ser igual.
Igual, por/que infelizmente o mundo é injusto?! Talvez.
A agonia da jovem a observar isso foi tão grande que ela exclamou:"_COMO VOCÊS SÃO BOBOS, IDIOTAS!!! Por que fazer isso?" E eles pararam. E ela chorou.
De verdade, o nenino negro era o mais lindo, tinha a pele mais uniforme que ela já viu, tinha o sorriso mais lindo, o jeito mais fofo e não precisava passar por aquilo. Ele foi o único que a respondeu e disse: "_Não fala assim com os meus amigos!"
Ela entendeu, deu sinal e desceu do ônibus.
Entendeu que certamente para aquele menino, aqueles garotos eram realmente seus amigos, talvez porque ninguém além deles quisesse a companhia dele, talvez porque em enrrascada eles fossem os únicos a defendê-lo. Mas a principal coisa que ela entendeu é que no tempo certo ele compreenderia o seu valor.

8 de julho de 2011

Estrangeiro


Meu nome é Suk.
Não sou mais criança.
Vou falar um pouco da minha infância.
Sou da Coréia do Sul, não vou entrar em detalhes referentes a meu país, apesar de sua história interferir diretamente na minha.
Meus pais também são coreanos, me planejaram.
Eu era uma criança feliz. Com a crise econômica minha família decidiu morar no Brasil, na prefireria do estado de São Paulo.
Passei boa parte da minha adolescência indo trabalhar com meus pais na "Feirinha da Madrugada", no bairro do Brás. Via adolescentes entrando e saindo de uma escola técnica que tem por ali, todo dia eles compravam uma coisinha ali e outra aqui, enquanto meus pais tinham que passar a madrugada, a manhã e a tarde toda vendendo bujigangas para pagar as contas e comprar alguma coisinha para mim, no fim do mês.
Parece que não, mas a situação ainda era melhor que na Coréia.
Hoje eu sou jovem e meus pais estão muito doentes. Hoje sou eu quem trabalho na feirinha, sou eu que não concluí os estudos. As coisas mudaram porque não estou brincando na feirinha, estou trabalhando, mas ainda observo aqueles outros jovens da escola.
Hoje eu vendia gravatas e lenços, 'tlês por 10', tenho amigos que vendem bolsas por 'tlinta real', aqui vem gente de todo o tipo. Quando vendia minhas bujigangas tinham duas meninas que compravam e conversavam, ouvi uma delas dizer: "_Ai, quero muito ir aos EUA, mas não quero ficar como essa gente." Não soube o que pensar. O que é essa gente? Por que somos vistos como 'os estranhos'? Os miseráveis?
Vir para outro país sem saber a língua é difícil, abandonar sua cultura e ainda ser tratado como um objeto que se compra e vende, ouvir as pessoas dizendo que somos grossos e comemos comida fedida. Não sonhava com isso na minha infância. Nunca sonhei com isso. Sonhava em estudar como aqueles jovens, em viver na minha terra, em ver meus pais bem, que adoeceram de tanto trabalhar nesse lugar.
Sim, não sabemos a língua, sim, somos diferentes, sim, vendemos tudo mais barato, porque no seu país a miséria é tanta que se não vendemos nossa própria alma pra você saciar seu desejo de consumo, morremos você e eu, você porque não tem como comprar o original, eu porque não vendo, não como, não...minha comida fede? Fede! Mas não tenho outra. Também não quero, moça, que você viva nos EUA, o que eu vivo aqui. Mas lá você não será muito diferente de mim aqui.
Eu era bem tratado e queria ser engenheiro, hoje estou acabado e sou vendedor ambulante... por isso prefiro fotos minhas na infância.

6 de julho de 2011

O poema


O poema me levará no tempo
Quando eu já não for eu
E passarei sozinha
Entre as mãos de quem lê

O poema alguém o dirá
Às searas

Sua passagem se confundirá
Como rumor do mar com o passar do vento

O poema habitará
O espaço mais concreto e mais atento

No ar claro nas tardes transparentes
Suas sílabas redondas

(Ó antigas ó longas
Eternas tardes lisas)

Mesmo que eu morra o poema encontrará
Uma praia onde quebrar as suas ondas

E entre quatro paredes densas
De funda e devorada solidão
Alguém seu próprio ser confundirá
Com o poema no tempo

Sophia de Mello Breyner
(1919-2004)