13 de janeiro de 2024

Veneza, idílica

 Ao chegar a Veneza, em julho de 2022,

os raios solares incidem sobre as águas 

do mar adriático

e o idílio da cidade captura o espírito.

Muitas línguas, muitos turistas

que, assim como eu, recebem o convite

das vielas labirínticas para se perderem

em outra temporalidade;

uma travessia por 1600 anos de história,

180 canais ou ruas d'água, 400 pontes

que expressam em suas ruínas

a coragem e a sabedoria dos italianos.

O cheiro da deterioração das algas da laguna

em contato com a atmosfera não fede,

por isso há avós, pais, filhos gondoleiros

remando sobre o bosque pantanoso. 

Quando li em 2019 que as águas em Veneza

subiram quase dois metros,

senti que o homem pode

criar e destruir tudo que é belo.

Quando li em 2020 que, devido à pandemia,

os peixes voltaram aos canais de Veneza

senti o mesmo. 

A primeira vez que li algo sobre a cidade

foi 'O mercador de Veneza', de Shakespeare

depois 'Morte em Veneza', de Thomas Mann,

nenhum dos dois italianos, mas

ambos me levaram a Dante Alighieri, Maquiavel, Boccaccio, Petrarca (saudades

das aulas de latim com a Bianca)

Pirandello, Italo Calvino, Umberto Eco, Ungaretti, Cesare Pavese, Primo Levi, Pasolini, 

Croce, Gramsci, Agamben, Silvia Federici

depois assisti filmes do Fellini e do Bertolucci,

e, finalmente, minha paixão recente está

em Ferrante e Natália Ginzburg.

Essas pessoas fazem eu me estranhar

pra me sentir menos estrangeira no mundo,

é por isso que eu ouço italiano com alegria 

e o falo com alegria dobrada;

ao observar as crianças sinto que quase posso compreender o que as torna italianas.

Fico encantada com barcos na 'garagem'

outra lógica de vida; 

me emociona passar pela rua do partido comunista, lembrar da resistência antifascista

e ver a vida pulsando quando o vento

toca as roupas penduradas no varal.

Quero usar as máscaras carnavalescas

e experimentar a igualdade de classes.

Veneza, talvez em Roma eu fosse

muito nova para dimensionar tudo

que meus olhos podiam ver, 

mas no presente eu estava pronta

pra você, no auge da minha maturidade

e equilíbrio, esse mesmo que

te mantém em pé, te sustenta.

Jamais você sucumbirá às águas,

porque elas não podem apagar 

o que é inesquecível, teu idílio.

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